sexta-feira, outubro 25

home is where love is




no seguimento deste mensagem, que registei para mim há vários meses e escrevi a uma grande amiga que emigrou para junto do namorado, apercebo-me do que isto significa para mim. a minha casa são as pessoas que amo, de quem gosto, com quem me identifico, as pessoas que estão no meu coração, espalhadas pelo mundo. e isso significa que me posso sentir em casa em muitos lugares. uma amiga disse-me que sou como os gatos, que se apegam aos lugares. é verdade. sou. gosto da minha casa porque me revejo em pormenores do que sou, do que gosto, das cores, da música (gosto de ter sempre a música na minha casa, sobretudo a dos andorinhões que cá moram, logo pela manhã); das viagens que fiz, das fases da minha vida, do que aprendi com elas e do que fui feliz e continuo a ser. sinto-me grata, mais uma vez, por tudo e todos que estão aqui. o apego e o desapego e esta relação estranha e moldável entre uma coisa e outra. posso ir de mochila (como gosto desta sensação de liberdade de trazer comigo o essencial), e o essencial está sempre comigo, e invisível aos olhos, como dizia o Exupéry. e este sentir-me em casa prolonga-se em conversas, escritas ou faladas, em sorrisos, em piadas via skype, em subtilezas ou grandes gestos logísticos. a mudança, mais uma vez. e como é bom mudar, conhecer outras lentes com que se vê o mundo, com que se aprende a crescer, a sermos nós. é este o caminho. é fácil? - não, de todo. mas é gratificante. muito. e percorrer lugares e reconhecê-los como casa, é ainda melhor. e poder voltar a esta casa, o símbolo físico do que sou, do espaço que ocupo e de todas as contingências. não é maravilhosa a vida?

quinta-feira, outubro 10

En Ti La Tierra

Pequeña
rosa,
rosa pequeña,
a veces,
diminuta y desnuda,
parece
que en una mano mía
cabes,
que así voy a cerrarte
y llevarte a mi boca,
pero
de pronto
mis pies tocan tus pies y mi boca tus labios:
has crecido,
suben tus hombros como dos colinas,
tos pechos se pasean por mi pecho,
mi brazo alcanza apenas a rodear la delgada
línea de luna nueva que tiene tu cintura:
en el amor como agua de mar te has desatado:
mido apenas los ojos más extensos del cielo
y me inclino a tu boca para besar la tierra.


(suspiro, Pablo...)

segunda-feira, setembro 30

"Velhos são aqueles que não visitam as suas próprias variadas idades."


conto Velho com jardim nas traseiras do tempo, Mia Couto

sábado, setembro 28


Quando regressei a Portugal, há pouco mais de um mês, senti-me uma preta em terra de brancos. Como se ninguém me compreendesse realmente ou eu aos outros, com a exceção dos que viveram a Guiné comigo.
O meu primeiro pensamento era a Guiné e o último do dia também. E depois, à noite, nos sonhos, eu ainda lá vivia. Agora essa dor estranha, de não saber onde queria estar, desdramatizou-se, ou arranjou um espaço confortável em mim para estar. A minha Guiné está em mim e eu nela, em tudo o que vivi e no pouco com que aprendi a ser feliz, sem distrações, com o que importa.
Apesar do meu regresso estar a ser bem mais generoso comigo do que eu imaginava (sinto que o universo me está a dar um verdadeiro welcome back!) fica aquela parte de mim, guineense, que tantas vezes é difícil explicar. Não há palavras que cheguem..., são as pessoas, os sorrisos, a curiosidade, uma certa ingenuidade. São o verde generoso que cobre o vermelho e o laranja da terra, que acompanha os caminhos. As cores das nuvens. As viagens, por terra e mar. E toda a felicidade que se aprende simples. E a minha melhor lição de gratidão. Como ela é gigante em mim.

quinta-feira, maio 23

do tempo por aqui

 
 
Nesta vivência na Guiné há tempo para não fazer nada, tempo para existir só, nos domingos, enquanto a electricidade não vem e o que se quer é apenas sobreviver ao calor com o mínimo de conforto e dignidade, até que a ventoinha se ligue novamente. Sim, dignidade, porque transpirar constantemente só porque se respira não é tolerável a qualquer um, facilmente somos forçados a continuar a gostar de nós mesmos, o que a princípio nos parece verdadeiramente improvável, mesmo suados como porquinhos. Há tempo para conversar com quem, muito provavelmente, noutro contexto, não se daria a oportunidade para tal, por causa de outras prioridades sociais e da constante falta de tempo na vida de crescido. Há tempo para absorver, contemplar e reflectir sobre o que de novo se conhece em nós mesmos; tempo para as conversas mais aparvalhadas, para dissecar outras até que o seu propósito se esgote. Há tempo para a sesta ou descanso com um livro depois do almoço, hora em que é imperativo parar, porque a electricidade também pára e porque é necessário garantir a produtividade depois das 15h30. E na vivência do dia-a-dia há sempre espaço para o que me toca, o que me (co)move. E não quero partir e perder isso.

sexta-feira, abril 26

preparar para as chuvas


Estamos prestes a mudar de casa. Gosto de mudanças e esta irá trazer dificuldades que ainda não sei prever, mas que de certeza vão existir, mas também coisas boas, como o facto de ser mais arejada. A casa onde tenho estado sofreu muitas alterações, mas na época das chuvas já trouxe muitas más noites, de calor e de humidade, onde dormir se torna difícil. É que do frio, há sempre a possibilidade nem que seja de uma botija quente para os pés, mas, do calor, sem electricidade, ninguém se livra; como já aconteceu acordar de noite com o calor e a falta de ar e abanar o leque para algum alívio, até adormecer novamente.
Mas agora estamos com boas perspectivas para a época das chuvas que está prestes a chegar, em que o calor e a humidade apertam e de que maneira. Aqui é assim, as pessoas preparam-se para as chuvas. E não se diz a chuva, mas as chuvas porque, de facto, parecem muitas em simultâneo. São duas Guinés diferentes: a do tempo seco e a das chuvas. E compõem-se telhados, terminam-se construções, investe-se mais no conforto porque, nas chuvas, tudo fica mais difícil; há lugares onde deixa de ser possível ir, e de onde deixa de ser possível sair, pelos caminhos que se tornam impercorríveis.

sábado, abril 20

pequenas férias na casa portuguesa









 
 
 
A vida na Guiné-Bissau é tão intensa... vivo do melhor, do mais gratificante, da aprendizagem, da aceitação, da descoberta, da linda e comovente ingenuidade de pessoas e dos olhares brilhantes de disponibilidade, do nô sta djunto, enfim... e do mais cansativo, pelas privações, dificuldades, frustrações. Ir à casa portuguesa com alguma frequência é absolutamente imperativo para manter um equilíbrio, entre as minhas referências e raízes e a minha vida neste país. E são as pequenas coisas, em qualquer uma das casas, que contam, que ficam, em mim e aqui: o Balú no quintal; delícia de café e bolinho-género-queijada-limão; chá no Porto; os meus novos óculos de sol comprados no mercado da Praça Carlos Alberto; uma linda janela no Porto; como gosto de andar por esta cidade que me maravilha sempre e ouvir a proximidade da praia que as gaivotas trazem para os telhados.

 

quarta-feira, março 6

da saudade





Sou uma típica portuguesa. No sentido em que a saudade é um sentimento que me acompanha sempre. E noutros sentidos também. Nas minhas férias de Natal escolhemos Coimbra para passarmos um fim-de-semana bem português e romântico. E agora, daqui, oiço a voz do Zeca e (re)vivo a saudade daqueles momentos e do Portugal, Portugal pequenino que apetece pegar no colo, num final de tarde em que não há ninguém à espera, ninguém para voltar, só a saudade disso.  Como todos aqueles que sonharam com um destino melhor para a liberdade, com outra liberdade mais honesta. Afinal também eu preciso de colo. E de uma bela catarse, em formato filme comovente, para deitar tudo cá para fora, para limpar os cantos à casa da poeira e restos de lixo que se vão acumulando, que não interessam a ninguém. Pior do que morrer de saudades é viver com elas.

sexta-feira, fevereiro 22

Crianças da Amazónia



Uma das coisas mais gratificantes é ver um bom documentário. Conhecer outras formas de viver, ideias que nunca me passaram pela cabeça, e sobretudo a partilha da visão de alguém sobre esse universo. Um bom documentário para mim é aquele que transforma e enriquece o meu conhecimento e que toca as minhas emoções. E chegar ao fim e sentir aquela gratificação própria de uma viagem. Este ainda não vi, mas quero muito ver! Pelo tom pessoal que a realizadora assume, pela música, pela vontade que fica em desvendar sobre o que a Amazónia tem mudado nos últimos anos e como isso influenciou a vida das pessoas e o crescimento das crianças, na maior floresta do mundo.

domingo, fevereiro 17

voltar a casa


Para quem não está... O que nos faz voltar a casa? Ou saber que está na hora de voltar a casa?
Para quem tem a necessidadede ir ver o mundo, de dar umas voltas e viver nele, mas noutro lugar, noutros lugares... o que faz com que sintamos que está na altura de regressar? Será esquecermo-nos do lugar das diferentes loiças nos armários da cozinha? Sentir que os outros começam a criar uma indiferença à nossa distância? Perceber que somos tão necessitados cá quanto lá? Ver a família a envelhecer e as crianças a crescer sem podermos fazer parte do processo e das pequenas coisas? O que nos distingue de fazer parte de um lugar e não de outro? Será que temos mesmo de ser de um lugar e não de outro, ou será que podemos fazer parte de vários, em momentos diferentes, e ambos permanecerem dentro de nós da mesma forma?