sexta-feira, outubro 25

home is where love is




no seguimento deste mensagem, que registei para mim há vários meses e escrevi a uma grande amiga que emigrou para junto do namorado, apercebo-me do que isto significa para mim. a minha casa são as pessoas que amo, de quem gosto, com quem me identifico, as pessoas que estão no meu coração, espalhadas pelo mundo. e isso significa que me posso sentir em casa em muitos lugares. uma amiga disse-me que sou como os gatos, que se apegam aos lugares. é verdade. sou. gosto da minha casa porque me revejo em pormenores do que sou, do que gosto, das cores, da música (gosto de ter sempre a música na minha casa, sobretudo a dos andorinhões que cá moram, logo pela manhã); das viagens que fiz, das fases da minha vida, do que aprendi com elas e do que fui feliz e continuo a ser. sinto-me grata, mais uma vez, por tudo e todos que estão aqui. o apego e o desapego e esta relação estranha e moldável entre uma coisa e outra. posso ir de mochila (como gosto desta sensação de liberdade de trazer comigo o essencial), e o essencial está sempre comigo, e invisível aos olhos, como dizia o Exupéry. e este sentir-me em casa prolonga-se em conversas, escritas ou faladas, em sorrisos, em piadas via skype, em subtilezas ou grandes gestos logísticos. a mudança, mais uma vez. e como é bom mudar, conhecer outras lentes com que se vê o mundo, com que se aprende a crescer, a sermos nós. é este o caminho. é fácil? - não, de todo. mas é gratificante. muito. e percorrer lugares e reconhecê-los como casa, é ainda melhor. e poder voltar a esta casa, o símbolo físico do que sou, do espaço que ocupo e de todas as contingências. não é maravilhosa a vida?

quinta-feira, outubro 10

En Ti La Tierra

Pequeña
rosa,
rosa pequeña,
a veces,
diminuta y desnuda,
parece
que en una mano mía
cabes,
que así voy a cerrarte
y llevarte a mi boca,
pero
de pronto
mis pies tocan tus pies y mi boca tus labios:
has crecido,
suben tus hombros como dos colinas,
tos pechos se pasean por mi pecho,
mi brazo alcanza apenas a rodear la delgada
línea de luna nueva que tiene tu cintura:
en el amor como agua de mar te has desatado:
mido apenas los ojos más extensos del cielo
y me inclino a tu boca para besar la tierra.


(suspiro, Pablo...)

segunda-feira, setembro 30

"Velhos são aqueles que não visitam as suas próprias variadas idades."


conto Velho com jardim nas traseiras do tempo, Mia Couto

sábado, setembro 28


Quando regressei a Portugal, há pouco mais de um mês, senti-me uma preta em terra de brancos. Como se ninguém me compreendesse realmente ou eu aos outros, com a exceção dos que viveram a Guiné comigo.
O meu primeiro pensamento era a Guiné e o último do dia também. E depois, à noite, nos sonhos, eu ainda lá vivia. Agora essa dor estranha, de não saber onde queria estar, desdramatizou-se, ou arranjou um espaço confortável em mim para estar. A minha Guiné está em mim e eu nela, em tudo o que vivi e no pouco com que aprendi a ser feliz, sem distrações, com o que importa.
Apesar do meu regresso estar a ser bem mais generoso comigo do que eu imaginava (sinto que o universo me está a dar um verdadeiro welcome back!) fica aquela parte de mim, guineense, que tantas vezes é difícil explicar. Não há palavras que cheguem..., são as pessoas, os sorrisos, a curiosidade, uma certa ingenuidade. São o verde generoso que cobre o vermelho e o laranja da terra, que acompanha os caminhos. As cores das nuvens. As viagens, por terra e mar. E toda a felicidade que se aprende simples. E a minha melhor lição de gratidão. Como ela é gigante em mim.

quinta-feira, maio 23

do tempo por aqui

 
 
Nesta vivência na Guiné há tempo para não fazer nada, tempo para existir só, nos domingos, enquanto a electricidade não vem e o que se quer é apenas sobreviver ao calor com o mínimo de conforto e dignidade, até que a ventoinha se ligue novamente. Sim, dignidade, porque transpirar constantemente só porque se respira não é tolerável a qualquer um, facilmente somos forçados a continuar a gostar de nós mesmos, o que a princípio nos parece verdadeiramente improvável, mesmo suados como porquinhos. Há tempo para conversar com quem, muito provavelmente, noutro contexto, não se daria a oportunidade para tal, por causa de outras prioridades sociais e da constante falta de tempo na vida de crescido. Há tempo para absorver, contemplar e reflectir sobre o que de novo se conhece em nós mesmos; tempo para as conversas mais aparvalhadas, para dissecar outras até que o seu propósito se esgote. Há tempo para a sesta ou descanso com um livro depois do almoço, hora em que é imperativo parar, porque a electricidade também pára e porque é necessário garantir a produtividade depois das 15h30. E na vivência do dia-a-dia há sempre espaço para o que me toca, o que me (co)move. E não quero partir e perder isso.

sexta-feira, abril 26

preparar para as chuvas


Estamos prestes a mudar de casa. Gosto de mudanças e esta irá trazer dificuldades que ainda não sei prever, mas que de certeza vão existir, mas também coisas boas, como o facto de ser mais arejada. A casa onde tenho estado sofreu muitas alterações, mas na época das chuvas já trouxe muitas más noites, de calor e de humidade, onde dormir se torna difícil. É que do frio, há sempre a possibilidade nem que seja de uma botija quente para os pés, mas, do calor, sem electricidade, ninguém se livra; como já aconteceu acordar de noite com o calor e a falta de ar e abanar o leque para algum alívio, até adormecer novamente.
Mas agora estamos com boas perspectivas para a época das chuvas que está prestes a chegar, em que o calor e a humidade apertam e de que maneira. Aqui é assim, as pessoas preparam-se para as chuvas. E não se diz a chuva, mas as chuvas porque, de facto, parecem muitas em simultâneo. São duas Guinés diferentes: a do tempo seco e a das chuvas. E compõem-se telhados, terminam-se construções, investe-se mais no conforto porque, nas chuvas, tudo fica mais difícil; há lugares onde deixa de ser possível ir, e de onde deixa de ser possível sair, pelos caminhos que se tornam impercorríveis.

sábado, abril 20

pequenas férias na casa portuguesa









 
 
 
A vida na Guiné-Bissau é tão intensa... vivo do melhor, do mais gratificante, da aprendizagem, da aceitação, da descoberta, da linda e comovente ingenuidade de pessoas e dos olhares brilhantes de disponibilidade, do nô sta djunto, enfim... e do mais cansativo, pelas privações, dificuldades, frustrações. Ir à casa portuguesa com alguma frequência é absolutamente imperativo para manter um equilíbrio, entre as minhas referências e raízes e a minha vida neste país. E são as pequenas coisas, em qualquer uma das casas, que contam, que ficam, em mim e aqui: o Balú no quintal; delícia de café e bolinho-género-queijada-limão; chá no Porto; os meus novos óculos de sol comprados no mercado da Praça Carlos Alberto; uma linda janela no Porto; como gosto de andar por esta cidade que me maravilha sempre e ouvir a proximidade da praia que as gaivotas trazem para os telhados.

 

quarta-feira, março 6

da saudade





Sou uma típica portuguesa. No sentido em que a saudade é um sentimento que me acompanha sempre. E noutros sentidos também. Nas minhas férias de Natal escolhemos Coimbra para passarmos um fim-de-semana bem português e romântico. E agora, daqui, oiço a voz do Zeca e (re)vivo a saudade daqueles momentos e do Portugal, Portugal pequenino que apetece pegar no colo, num final de tarde em que não há ninguém à espera, ninguém para voltar, só a saudade disso.  Como todos aqueles que sonharam com um destino melhor para a liberdade, com outra liberdade mais honesta. Afinal também eu preciso de colo. E de uma bela catarse, em formato filme comovente, para deitar tudo cá para fora, para limpar os cantos à casa da poeira e restos de lixo que se vão acumulando, que não interessam a ninguém. Pior do que morrer de saudades é viver com elas.

sexta-feira, fevereiro 22

Crianças da Amazónia



Uma das coisas mais gratificantes é ver um bom documentário. Conhecer outras formas de viver, ideias que nunca me passaram pela cabeça, e sobretudo a partilha da visão de alguém sobre esse universo. Um bom documentário para mim é aquele que transforma e enriquece o meu conhecimento e que toca as minhas emoções. E chegar ao fim e sentir aquela gratificação própria de uma viagem. Este ainda não vi, mas quero muito ver! Pelo tom pessoal que a realizadora assume, pela música, pela vontade que fica em desvendar sobre o que a Amazónia tem mudado nos últimos anos e como isso influenciou a vida das pessoas e o crescimento das crianças, na maior floresta do mundo.

domingo, fevereiro 17

voltar a casa


Para quem não está... O que nos faz voltar a casa? Ou saber que está na hora de voltar a casa?
Para quem tem a necessidadede ir ver o mundo, de dar umas voltas e viver nele, mas noutro lugar, noutros lugares... o que faz com que sintamos que está na altura de regressar? Será esquecermo-nos do lugar das diferentes loiças nos armários da cozinha? Sentir que os outros começam a criar uma indiferença à nossa distância? Perceber que somos tão necessitados cá quanto lá? Ver a família a envelhecer e as crianças a crescer sem podermos fazer parte do processo e das pequenas coisas? O que nos distingue de fazer parte de um lugar e não de outro? Será que temos mesmo de ser de um lugar e não de outro, ou será que podemos fazer parte de vários, em momentos diferentes, e ambos permanecerem dentro de nós da mesma forma?

terça-feira, dezembro 18

I travel light

Neste para trás e para a frente, viajo com o indispensável na mochila. Mesmo no poiso que mais se aproxima do que é a casa, o "settling" é leve, despojado de muitas coisas que evito acumular. E não preciso de mais, de mais coisas. Mas preciso de me sentir mais em casa. E nestes frescos 32, há desejos que se definem e caminhos que se desenham. Depois de ir há sempre a necessidade de voltar. Fecho os olhos e o meu coração enche-se com a antecipação dos abraços apertados, as lágrimas no canto do olho, aquela vontade de querer contar e não saber por onde começar...

sexta-feira, novembro 9

a mulher da GB

A mulher guineense, e suponho que a africana em geral, anda de cabeça erguida, exibindo com confiança as curvas e as cores que se multiplicam nos panos, nas blusas e nos lenços na cabeça. Embora trabalhe tanto ou mais que dez homens juntos, nunca ouvi nenhuma a queixar-se. Ainda se fala da emancipação feminina... emancipação masculina precisa-se!

quarta-feira, novembro 7


Um companheiro de viagens que me faz perguntas como "Os teus pais estão de vida?", "O teu irmão é simples assim como tu?", contou-me que Deus deu o nome de Vicente ao burro, mas, como ele se esquecia sempre do seu nome, passou a ser chamado de burro! "O burro é um animal que protege à noite dos espíritos, dos lobos, das coisas más assim. Mas se te cortas e sangras e queres ir para o hospital no burro, não vais chegar lá com vida".

domingo, novembro 4

E depois de umas férias merecidas na casa portuguesa, voltar à GB, ainda que de espírito renovado, está a ser mais desafiante. Por aqui o caminho agora é feito com os pés mais assentes na terra e um olhar menos sonhador; a magia fácil deu lugar a uma integração mais racional, a uma visão menos romântica e paciente. As dificuldades grandes e pequeninas são vividas com uma intensidade que dói, mas que se aprende a aceitar num exercício constante. E essa flexibilidade vai sendo exercitada todos os dias, várias vezes, fortalecendo um lado de mim que eu quase desconhecia. Mas essa solidez não se impõe nem rouba espaço à sensibilidade, que continua aguçada por toda a beleza, ou falta dela, por toda a riqueza, ou falta dela, por toda a compaixão, ou pela sua inexistência. Esperar o mínimo e fazer o máximo poderia ser um lema de vida, já que as expectativas devem ser sempre refreadas por aqui e se trabalha sempre para fazer o máximo e o melhor de todos os dias, das pequenas dádivas, mesmo de coisas simples, como gerir as horas de electricidade. Por aqui a percepção e reconhecimento dos pequenos milagres diários estão mais alerta e por isso tudo continuo a sentir uma enorme gratidão.

terça-feira, maio 15


 
Houve alturas na minha vida em que sentia que era demasiado fraca para ser ambiciosa. Nunca tive a intenção de ter uma grande carreira, aliás nunca soube o que queria fazer... e ainda que tenha descoberto um trabalho que me preenche de uma forma que nunca conheci, continuo sem ter um objectivo muito concreto. Vou caminhando e o caminho vai-se abrindo para mim, vou podendo ver mais além. Nesses tempos, além de pensar que a vida aos trinta estaria decidida e resolvida, pensava que ser-se bem sucedido era construir uma carreira profissional em formato yuppie. Depois comecei a perceber que a vida não se instalava aos trinta, aliás, muita coisa despertava nessa idade e continuaria felizmente a aprender e, que muitas ou a maioria dessas aprendizagens passariam por coisas inimaginadas aos quinze, sendo que muitas delas acabariam algumas vezes por corresponder não ao que queria, mas ao que precisava. E com essas primeiras aprendizagens, a ambição de desconstruir as minhas limitações; ultrapassar os meus medos; aceitar e reconhecer o que é humano em mim e nos outros; potenciar. E o agradecimento diário.

sexta-feira, abril 27

medos

Estar e viver na Guiné tem-me ajudado a relativizar medos. Qualquer pessoa que saia da sua zona de conforto sente-se inseguro ao mudar de lugar. E sair de um país seguro num continente como a Europa, para um país africano, onde a instabilidade pode ser a surpresa do dia, alimenta e trabalha uma capacidade que todo o ser humano tem, mas que a flexibiliza conforme pretende ou lhe é exigido, a da paciência e tolerância. Guiné precisa di bu paciência. Ou África precisa di bu paciência. E esta impermanência não se confina ao acto de esperar pelo tempo que é necessário que decorra até que as coisas aconteçam nos nossos moldes, mas de tolerância e respeito pelas coisas que não vão de encontro a eles. Eu sempre achei que a humildade era um pilar que permitia, sustentava e abençoava a aprendizagem e, mesmo tendo essa lição corroborada em inúmeras pequeninas situações, nunca o vivi de uma forma tão intensa e generalizada como agora, depois da Guiné. Houve gente que me disse, que me avisou: há um antes e um depois de África. E há mesmo. Eu poderia tentar explicá-lo ou defini-lo como uma flexibilização de padrões, de formas de estar, celebrizada com a partilha de uma garrafa de vinho com um guarda nocturno de hotel. Deixar de ver uma qualquer pessoa como uma pessoa qualquer com quem se pode partilhar histórias, olhares cúmplices que conhecem, como eu, do que são as dores do mundo, da música que toca, do amor. Isso é humildade, sempre em letra pequena; isso é dar a outra face, sentir a compaixão, aceitar, integrar. Se existe, faz parte. E resolve-se confiar, porque a surpresa é, na maioria das vezes boa. Tantas vezes entrei sozinha em táxis depois de anoitecer a pensar que tudo seria possível. E a realidade surpreendeu-me sempre com uma conversa de mim pra ti, entre nós iguais, com as mesmas bondades, maldades, humanidades. E que o medo venha, depois, se for preciso, mas não sem saber, sem conhecer. E continuo a sentir-me grata por isso, pela Guiné no meu caminho e continuo a querer voltar, ainda mais. Espero e desejo-os bem. À Guiné, aos meus que lá estão e a todos os guineenses.

quarta-feira, outubro 5

o nosso (a)braço de mar


No mesmo dia em que verti as primeiras lágrimas de frustração, stress, senti a vibração intensa de tudo à minha volta.
O percurso para a DRE - Direção Regional de Educação - onde tenho estado a dar formação, combina um ambiente de cidade colonial decadente com o meio rural. Estamos na sede do Instituto Camões, numa sala de formação enriquecida, não no que é visível, mas pela vontade. Estou fascinada com o grupo de formadores do nosso programa que, perante um sistema educativo mortiço, caótico, desestruturado e anárquico, se recusam a baixar os braços. Eles acumulam cargos: são, além de formadores, professores, inspectores, directores de escolas, enfim. E como acumulam cargos, acumulam horas de trabalho e mesmo assim investem na sua própria formação e na formação dos professores guineenses que não foram dotados das competências necessárias para exercerem essa função ou, simplesmente, a exercem porque na sua tabanca são o recurso humano mais adequado para tal. E a beleza disto tudo intensifica-se na humildade que têm, na vontade de mais e melhor.
Este caminho diário tenho-o feito de bicicleta: na terra que percorro cruzo-me com porcos, cabras, galinhas, pessoas de cá: ora "bom dia", ora "branco", já aconteceu "chinês", por crianças sinceras que não guardam o que pensam.
Em África tudo é mais intenso: os cheiros, as cores, a falta ou ausência, o essencial e a noção disso, o sol, a chuva, os sorrisos, as lágrimas. E lembro-me que foi neste continente que apareceu o principezinho que ensinou que o essencial é invisível aos olhos.

nova casa

viemos para Canchungo no dia internacional da paz. acho que memorizei isto porque lhe atribuí significado: vou precisar de alimentar muito bem a minha paz interior para viver bem numa casa húmida e escura. vale-me de muito a minha companheira de casa que, mesmo sem se aperceber, me dá força e boa disposição. Integrar esta forma de viver não é fácil e sinto que vou passar por transformações.
é estranho como se pode vivenciar o tempo de formas tão diferentes. estou cá na Guiné-Bissau há quase um mês e parece que já passou imenso tempo. por tudo ser novidade. e a rotina que estrutura os dias ainda mal se instalou, muito menos haverá espaço para que alguma indiferença.
uma viagem longa, que continuará a fazer sentido sempre que me conseguir encontrar neste caminho. crescer dói, mas é muito bom. e pensar que a saudade dói, mas vai de certeza temperar o reencontro, apertar ainda mais aquele abraço.

segunda-feira, setembro 5

mudança

eu confesso que não tenho dado muita prioridade a este meu espaço que prometi a mim mesma cuidar. mas as razões têm sido válidas, de repente vou para a guiné bissau, trabalhar com uma equipa fantástica de uma ong. é preciso ter cuidado com o que se deseja, porque pode mesmo acontecer. com tanta informação nova a abraçar e pessoas a deixar por cá, tem sido difícil sequer parar. e o que assusta é saber que nunca nada mais vai ser igual. é tempo de mudança.

segunda-feira, agosto 15

os amigos são o melhor do mundo

quando dizem que os amigos são o melhor do mundo, esquecem-se de dizer porquê. os amigos são aqueles que nunca te deixam. dizem-te na cara o que pensam e o que sentem perante o caminho que estás a tomar, seja ele bom ou menos positivo. são o que são, na sua genuinidade deles; e gostam de ti assim, na tua genuinidade. assumem os seu egoísmos perante ti. apreciam as tuas qualidades e sublinham-nas, vão buscá-las na conversa. os amigos cuidam, sabem quando estás mal. procuram estar perto, não julgam, amam, independentemente das diferenças que a vida traz.



domingo, agosto 14

jantares cor-de-rosa


os jantares cor-de-rosa são encontros de amigas. fala-se de tudo, de amor, de família, de amigos, de problemas. sofre-se com as situações de umas, rimo-nos de situações de outras. fala-se de sexo, partilha-se opiniões, mas sempre com uma maturidade e honestidade que me surpreendem sempre pela positiva. (gosto imenso de ser surpreendida pela positiva, quem não gosta?)fala-se de doenças, de tragédias, de pormenores, histórias mínimas e qualquer uma que até possa ser pequena ou ridícula é assumida com importância.
e foi assim, um jantar que nem de propósito acabou por ser feito de ervilhas-de-cheiro cor-de-rosa (que têm um cheiro que me leva à infância), rosé, gelado de frutos vermelhos. com todas reunidas, um verdadeiro jantar cor-de-rosa.

terça-feira, julho 19

Arcade Fire - No Cars Go



ir a um festival era uma das coisas de que não me tinha apercebido de que tinha saudades até voltar a ir. ao super bock super rock. a aventura começa com a preparação do material de campismo e com a ideia de levar a casa às costas. mas uma casa light, despojada. I travel light. e depois a euforia da música, e uma banda de sempre - Portishead. e uma mais recente banda de sempre - Arcade Fire. E sinto-me uma adolescente, mas com outra consciência, outro sentido mais completo de vivenciar.

Já não vinha cá há uns tempos, senti-me vazia para escrever o que fosse, acho que foi um momento de absorção e digestão. mas tento sempre lembrar-me que a escrita é sempre uma questão de honestidade. comigo mesma. e é isso que nos torna mais humanos, não é?

quinta-feira, junho 9

home, sweet home

sou uma rapariga de dar oportunidades. a coisas que sei que à partida não me atraem, com que não me identifico. e uma oportunidade de trabalho tem-me levado estas semanas a Lisboa. mas sempre soube que não era um sítio onde gostasse de viver, na grande cidade. sou uma rapariga de lugares mais tranquilos, cidade sim, mas com uma dimensão que consiga reunir o melhor de dois mundos: ofertas e diferenças culturais mas também o calor, o acolhimento de quem é dali. na grande cidade vê-se uma tristeza e solidão intrínsecas, que são uma forma de viver. e parece que vivo uma rotina que não é minha, a rotina do metro, da confusão, mas de uma personagem que ando a experimentar, o que acaba por ser interessante para mim também, claro. mas sou cada vez mais rural, é certo, no sentido em que, para me sentir bem, tenho mesmo de viver a um ritmo mais calmo do que o que a grande cidade impõe. e ainda por cima mulher do norte, que pressupõe uma série de valores - que prefiro chamar de coisas boas - é inegável. ir e vir acaba por ser bom, uma experiência como outras. e voltar a casa, onde ela é agora, é cada vez melhor.


sexta-feira, maio 27

querida avó


tenho saudades do teu lugar na minha vida, das tuas mãos fortalecidas pelos trabalhos de mãe, de avó, da tua disponibilidade sempre total para me leres, da luz do final do dia na tua cozinha, da cevada e regueifa com planta ao pequeno almoço, antes da missa de domingo, do pão com ovo estrelado ao sábado à noite.. e de todos os nossos debates em que discutíamos as nossas perspectivas encarceradas pelas vivências de cada uma e diferença de idades... no fim, já só houve espaço para o interesse e amor com que aprendíamos e ensinávamos as diferenças uma à outra. ou talvez para as semelhanças. e ficou a tua imortalidade, nas minhas memórias, em objectos e móveis espalhados pela minha casa, na forma como em frente ao espelho apanho o cabelo e pinto os lábios de um vermelho suave. quem já não está cá é imortal em mim e nas histórias que revivo ou conto, até eu desaparecer e quem já fora, ser apenas um retrato a preto e branco numa caixa esquecida.

domingo, maio 22

Another Year



gosto de filmes e histórias sobre pessoas normais. o Mike Leigh faz filmes assim, tem o dom de contar histórias sobre a humanidade em cada um de nós, uns mais heróis do que outros, mas todos com um interesse e uma honestidade incríveis, na sua vida normal e real. não é isso também que se procura nas histórias? - encontrarmo-nos em cada uma delas, no mais belo e no mais obscuro.

quinta-feira, maio 19

a dor de ser





há dias em que tudo está bem, o sol raia no céu, mas pelo corpo e pela alma perpassa uma dor, aparentemente ser razão alguma. e a música certa a tocar alimenta esse sabor, o da dor de ser.

sexta-feira, maio 13

no primeiro dia de praia…




reaprende-se a familiaridade da areia nos pés, vive-se a excitação pueril dos mergulhos no mar seguidos por aquela serenidade que o sol pousa na pele. a praia fez sempre parte e continua a despertar em mim a mesma alegria que despertava na minha infância e adolescência, ainda que se torne mais demorada a entrada no mar frio. o primeiro banho, ainda que nunca o tenha tomado em janeiro, tomo-o sempre como uma espécie de consagração, um ritual de limpeza da alma, das energias, do espírito. um começar de novo. e sentir-me pequenina naquela imensidão é estranhamente bom.

segunda-feira, maio 9

Au Revoir Simone-The Lucky One

lolita


dou por mim a pensar num céu de gatinhos que brincam e dormem confortáveis em nuvens fofinhas, ou que um dia vou conhecer alguém em quem ela terá reencarnado. é assim que funciona muita gente perante a morte, não é? a lolita foi uma gatinha muito especial, de olhar forte, espirituosa e com uma energia e ternura que marcaram a minha vida, a da gata júlia e a de todos os amigos que conviveram com ela cá em casa. só me resta mesmo agradecer o mimo que ela me deu, a companhia fiel, como se de um cão se tratasse. as alminhas dos animais despertam uma ternura especial, e ocupam um lugar diferente, porque nos ensinam um amor totalmente gratuito, incondicional e que se rege por essa linguagem, a do amor por si só.

domingo, maio 1

dia da mãe

convidei a minha mãe para almoçarmos fora. porque ela nunca sai de casa, não é capaz de sair sozinha, fruto de um casamento precoce e divórcio consequente. eu podia dizer que ela investiu os melhores anos da vida dela nisso, mas e eu? nem me casei, muito menos me divorciei. ela pelo menos ainda teve tempo de ter dois filhos impecáveis. não, não há fotografia do almoço, mas posso aqui descrever que teve direito a uma praceta ao ar livre, mesa protegida da chuva morna de abril... sangria de champagne e pastas maravilhosas de marisco e vegetais frescos, como se quer. acho que posso agradecer por tudo o que sei que até ao fim da minha vida me vou esforçar por compreender, necessidades idênticas, consciências e linguagens distintas. às vezes papéis invertidos...
confortável no constante sorriso de golfinho
quero ser uma árvore enraizada na minha terra
e de braços bem abertos para a vida

sábado, março 26

Decidi fotografar um final de tarde de uma primavera amena e tardia.
Um pedaço de telhado visto por detrás de um muro banhado pelo sol - "neste final de dia tenho direito a uma luz intensa". Comido pelo tempo, onde se lê as chuvas e os sóis que já ali pousaram, diz-nos frontalmente "permaneço". E tudo em seu redor não consegue ser mais, ter mais coisas para contar, do que aquele pedacinho de telhado.
Ao fundo vêem-se plátanos. cujas folhas ondulam levemente, já escuras, banhadas pela sombra de altos eucaliptos. Escondem uma antiga e abandonada fábrica que já não existe, mas permanece como uma memória. As andorinhas ainda cantam, mas sossegadamente, e os pássaros cantam ainda na última hora de sol.
O pedaço de telhado já está coberto pela sombra, mas permanece.

segunda-feira, março 14

o meu caminho

Há qualquer coisa de regresso à vida simples que me atrai nos dias que correm. É o evitamento dos caminhos que se pagam que levam à descoberta de outros, onde descubro casas e ruas banhadas pelo sol que me inspiram curiosidade, pelas vidas calmas junto ao mar, o próprio ritmo com que se faz um percurso, mais lento. E esta cadência convida a outra vivência, a troca do destino pela vivência do caminho. Não será a tudo isto que a nossa responsabilidade é chamada? Ou pelo menos virar-nos para o prazer que a própria dificuldade nos obriga? Não sei ainda muito bem qual o desfecho das coisas, mas tudo me parece tão evidente às vezes, ir ao encontro do melhor que a vida oferece. Será isto um optimismo patológico? Não tenho vontade nenhuma de apanhar com os discursos pseudo conscientes de que a vida corre mal e vai piorar... the hell with it, não quero isso para mim e esse caminho é o único que conheço, o único definitivo.